“Quando eu nasci
o silêncio foi aumentando.
Meu pai sempre entendeu
Que eu era torto
Mas sempre me aprumou.
Passei anos me procurando por lugares nenhuns.
Até que não me achei – e fui salvo.”
– MANOEL DE BARROS (em “Concerto a Céu Aberto para Solos de Ave”)
A poesia de Manoel de Barros, além de ser belíssima, naturista e original, tem um quê de zen-koan (as máximas zen-budistas criadas para desafiar a razão comum, e nos fazer despertar). Espeta nossas ilusões usando frases simples, subverte a mente condicionada com uma criatividade infantil. Como nossa mente é quadrada, meu Deus do céu. E Manoel propõe sua nova física da relatividade das palavras sem usar seriedade nenhuma, rindo como um velho (menino) que botou o relógio pra funcionar ao contrário.
Ele ri, mas faz arte sacra. Desobece as palavras e desordena os sentidos para nos ajudar com uma linguagem maior, que vem da quietude. “Quando eu nasci o silêncio foi aumentando”…
Manoel é tipo um surrealista do mato. Os elefantes contagiosos de Paul Éluard são pobres animais de zoológico perto da selvageria lírica viva de Manoel. Não é só uma quebra dos limites, é a revelação de um firmamento inteiro.
“Ao poeta faz bem – desexplicar”, diz ele (aos não-poetas idem).
Que possamos também nascer.
E deixar nossos silêncios crescerem, crescerem.
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Arte: @_nkml_
Zen-Koan
“Quando eu nasci o silêncio foi aumentando”…
Que o mundo tenha mais Koans assim, ao invés do rodar de posts de redes sociais.
Que tenhamos mais silêncios ensurdecedores de plenitude, ao invés dos vazios assustadores da vida digital.
Perfeito, Gleison!