“Quando queremos que todos os seres em todas as direções sejam felizes, surge em nós a intenção de amar. Esse desejo de amar entra em nossos sentimentos, percepções, formações mentais e consciência, e se torna manifesto em todas as nossas ações, falas e outras atividades mentais. Os eventos que não são físicos nem mentais surgindo a partir daí estão em sintonia com o amor e podem ser chamados de amor, já que o amor é sua raiz. Esses eventos determinam nossas ações futuras, e são dirigidos por nossa vontade, que agora está impregnada de amor. A vontade é a energia que dirige nossas ações e nossa fala. O mesmo é verdadeiro em relação ao surgimento da compaixão, alegria e equanimidade”.
— Nagarjuna, em “Maha-Prajna-Paramita Sutra”.
Depois de ler essas palavras, me pergunto se hoje existe alguém que tem verdadeiramente a intenção de amar nos dias de hoje. Não a intenção de ser amado. Nem a intenção de amar-para-ser-amado. Mas de amar. E de amar todos os seres.
Amar não como uma manobra neurótica, como querer amar para se sentir especial ou amoroso ou elevado ou “espiritual”, ou querer amar todos os seres para esconder o fato de que na verdade odeia boa parte deles, mas jamais fará contato com isso. Mas quem realmente quer amar todo mundo, todos os seres, tudo? Se já mal conseguimos amar a namorada ou o namorado ou a esposa ou o marido ou a mãe, o pai, etc, porque eu deveria me importar em amar todo mundo? Isso seria possível?
Mais: o que tem a ver amar todo mundo com auto-conhecimento?
A resposta a isso não pode ser apenas no nível da lógica ou racional. Se vamos buscar descobrir a relação entre amar todos os seres e o auto-conhecimento, é necessário amar, para que então possamos ver o que isso tem a ver com auto-conhecimento. Qualquer resposta meramente intelectual não terá comparado, de fato, as duas coisas. É como comparar sorvete com qualquer outra coisa: você tem que experimentar o sorvete para poder compará-lo a essa outra coisa. Se, de fato, conseguirmos experimentar amar a todos, então poderemos descobrir mais a respeito. Mas nunca só pelo discurso sobre o amar.
Uma consequência de amar todos os seres que talvez possamos falar (um pouco) é a redução de tensão que isso gera como consequência. O ato de amar e desejar permanentemente a felicidade de todos os seres coloca aquele que ama numa experiência de nítida redução, ou até extinção, de tensão. Não há mais muita motivação para hostilidade, medos, defesas, ansiedades, rigidez. O corpo pode respirar. A mente pode relaxar. Queremos a felicidade de todos, indiscriminadamente, todo o tempo. Essa ausência de tensão tem mais um efeito colateral poderoso: as distorções cognitivas causadas pela carga de medo, divisão, ansiedade, são reduzidas a permitir que a visão da realidade seja ampliada, seja maior e mais clara. Por mais sutil que seja, a tensão geralmente traz confusão, coloca o organismo em estado de defesa, de alerta, de preocupação. Uma mente ansiosa e um corpo tenso dificilmente vão conseguir ter o discernimento e a lucidez necessárias para ver algo com clareza. Uma mente amorosa e compassiva, e um corpo relaxado, conseguem ir muito além. Inclusive conseguem ver a si mesmo. Mas não farão nada disso no discurso, farão por amar.
Em outro trecho do mesmo, Nagarjuna explica que esse amar tem que ser a todos os seres, indiscriminadamente. Uma mente iniciante não consegue isso, mas é preciso treiná-la com longa prática. “Não é suficiente praticar o amor apenas às pessoas queridas, ou às pessoas boas, ou aqueles que nos fizeram bem; (…) é necessário adquirir um afeto por e amar igualmente e sem nenhuma diferença os três tipos de seres, amigos (priyapudgala), inimigos (yairipudgala) e neutros (madhyastha) (…)”.
Para muitos, amar a todos é um fim em si, e talvez um dos propósitos régios da própria vida humana:
“Sem amor, não há razão para conhecer ninguém, porque no fim das contas o amor é que nos conecta com nossos vizinhos, nossos filhos e nossos corações”.
— Martin Luther King Jr.
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lembro de uma fala de um amigo do Dharma, que uma vez me disse assim: Deseje a felicidade até daqueles que perturbam, pois gente feliz não enche o saco!
Grato Nando
Hahahah, boa. O Dalai Lama também tem uma fala nesse sentido, em que ele diz que mesmo se você for egoísta, faça o bem aos outros, porque isso retorna pra você.
Um abraço, Ed.
Muito bom! É o amor incondicional penso ser este o sentimento cristico, o ser que ao despertar consegue sentir-se pleno com todos os seres do universo! Paulatinamente chegaremos lá. Faz parte da lei que une a todos nós, quando a comunhão com Deus se faz constante! Gratidão
Do poema Amar – de Carlos Drumond de Andrade “…amor distribuído pela coisas préfidas…”. Para o iniciante espiritual é um drama a questão do amor incondicional por todos e por tudo. É necessário tempo, perseverança e com alguma sorte um “orientador” por esse caminho. Ainda me encontro como iniciante mas posso dizer que esse estado de “ser” o amor, de sentí-lo, de vibrá-lo nos liberta demais. É transformador e não há volta! Gratidão.