Bert Hellinger e o surpreendente efeito de aceitar “tudo que me lamento, queixo ou acuso”

O alemão Bert Hellinger, terapeuta e criador da cada vez mais popular “Constelações Familiares“, ou “Constelações Sistêmicas“, é autor de diversos livros sobre o que chama de princípios e leis dos relacionamentos humanos, como “A Simestria Oculta do Amor” e “O Essencial é Simples“, e deles vem uma série de aforismos profundos sobre auto-conhecimento e a cura de relações. Um deles, por exemplo, diz que “o critério para o que é bom é baseado no que traz alívio a alguém, o que traz alegria ou que reduz um estresse” (Acknowledging what is: Conversations with Bert Hellinger, 1999). Outro diz que “A experiência pode ser significativa apenas quando a deixamos pra trás. Significando: seguindo em frente, transformado” (On Life and Other Paradoxes: Aphorisms and Little Stories from Bert Hellinger, 2002).

Mas gostaria de trazer um aqui que fala sobre a comunicação que usa o lamento, a crítica ou a queixa, algo bastante fácil de fazer, e que alguns podem entender como bastante natural, necessário até, e talvez obrigatório. O aforismo diz o seguinte: “Tudo aquilo de que me lamento ou queixo, quero excluir“, segundo Hellinger. A frase é o início de um texto que segue abaixo sobre um tipo de postura ou atitude psíquica reativa diante de algo ou alguém. Diante do mundo, basicamente. Hellinger é um estudioso e um experimentador nato, um psicoterapeuta que une um lado poderoso da observação e da capacidade de compreensão com a experiência aberta e comprometida com a verdade, então não é uma atitude muito prudente simplesmente negar essas afirmações sem uma reflexão séria. E partindo do princípio que todos nós já nos lamentamos, criticamos ou nos queixamos de alguma coisa ou de alguém, ou que podemos estar fazendo isso com certo engajamento, pode ser interessante entender o que esse curador veterano tem a dizer sobre a dimensão mais profunda dessa atitude.

Mais interessante que isso pode ser considerar a sugestão de Hellinger: integrar o que se rejeita. Fazer isso é acolher a própria sombra, reconhecer o que tivemos alienando em nós mesmos há muito tempo, e assim uma libertação — de nós mesmos e de todos os outros. Não é fácil, pois a tarefa de acusar e criticar é, em si mesma, um mecanismo de não ver e de continuar não vendo (vemos nos outros). Mas a frase inicial tem um poder especial, que talvez suscite uma curiosidade em nossa consciência, de talvez aceitá-la, de talvez pesquisá-la, de talvez experimentá-la.

“O melhor trabalho político, social e espiritual que podemos fazer é parar de projetar nossa sombra sobre os outros”.
Carl G. Jung (1875-1961)

Eis o texto:

“Tudo aquilo de que me lamento ou queixo, quero excluir. Tudo aquilo a que aponto um dedo acusador, quero excluir. A toda a pessoa que desperte a minha dor, estou a excluí-la. Cada situação em que me sinta culpado, estou a excluí-la. E desta forma vou ficando cada vez mais empobrecido.

O caminho inverso seria: a tudo de que me queixo, fito e digo: sim, assim aconteceu e integro-o em mim, com todo o desafio que para mim isso representa. E afirmo: irei fazer algo com o que me aconteceu. Seja o que for que me tenha acontecido, tomo-o como a uma fonte de força. É surpreendente o efeito que se pode observar neste âmbito. Quando integro aquilo que antes tinha rejeitado, ou quando integro aquilo que é doloroso para mim, ou que produz sentimentos de culpa, ou o que quer que me leve a sentir que estou a ser tratado de forma injusta, o que quer que seja… quando tento incorporar tudo isso, nem tudo cabe em mim. Algo fica do lado de fora. Ao consentir plenamente, somente a força é internalizada. Tudo o resto fica de fora sem me contaminar. Ao invés, desinfecta, purifica-me. A escória fica de fora, as brasas penetram no coração.”

Bert Hellinger

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8 Comments

  1. says: Francisco Jose Soares Lopes Dias

    A sugestao dada e dertamente muito boa. Eu gosto de pensar em assuntos que nao domino, assim vou me debrucar sobre este tema

  2. says: Felyzpe

    Se tivermos viva a percepção de que tudo é passageiro e que a impermanência rege nossas vidas fica mais fácil de se distanciar do impulso de rejeitar o desagradável.

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