A tecnologia recente de comunicação — principalmente smartphones e as redes sociais — tem sido pivô de uma série de reflexões (e condenações e acusações) sobre como vem mudando o comportamento atual das pessoas, levantando questões como a presença, a atenção ao outro, a vida virtual versus a vida real, a fuga, o imediatismo, a imagem, o vício, entre outras coisas. Numa de suas sessões de Perguntas & Respostas em sua vila de prática espiritual, a Plum Village, na França, em 2014 (antes da internação), o mestre zen Thich Nhat Hanh respondeu a uma pergunta que trata diretamente desse cenário: “é possível ter atenção consciente, ou ser consciente (be mindful) enquanto se usa smartphones e redes sociais?“. O vídeo abaixo, traduzido e legendado na íntegra por este blog, mostra a pergunta e a resposta de Thay, no total de 13 minutos (se você não tiver disponibilidade, vale a pena ao menos os primeiros 4 ou 5 minutos).
A resposta é simples e traz uma visão incrível sobre o tipo de consciência e atitude que precisamos despertar para lidar com a tecnologia de comunicação. “A tecnologia e os smartphones podem ajudar a nos conectar uns aos outros, mas a comunicação real tem estado mais difícil“, diz Thay. A comunicação real: aquela onde há abertura e entendimento real entre duas (ou mais) pessoas. Aquela em que se ouve, se entende, se troca, se toca, em que há profundidade. Thay cita várias vezes na resposta a escuta profunda e a escuta compassiva, aquilo que acontece quando realmente há presença, interesse no outro e vontade de compreensão. E também a “fala do amor” (loving speech), que é o que mantém o ambiente de comunicação e compreensão mais saudável.
Para que queremos a tecnologia, os smartphones e as redes sociais, afinal? É uma evolução científica e uma corrida capitalista ou vamos apontar para alguma direção humana? Acho que temos percebido – e muitos de nós provocado ou corroborado – a acentuação da surdez mútua e da afirmação aguda da individualidade nesses ambientes hiper-conectados. Não escutamos profundamente, nem escutamos com inclinação a entender nem a se aprofundar. E temos que admitir isso, sem desculpas nem acusações sobre o outro. Temos, por exemplo, uma opinião, ou várias, e nos identificamos com ela, porque, oras, afinal ela é a “certa”, e não pode ser atacada. A conexão realmente acontece, rápida, o dia inteiro, as informações circulam, é fantástico, mas a evolução humana que poderia decorrer daí está aquém da sua capacidade. E principalmente nos smartphones e nas redes sociais, onde a comunicação entre nós é mais frequente, ondas as trocas são permanentes. “Não conseguimos nos comunicar com nós mesmos! Na verdade, estamos tentando fugir de nós mesmos“, diz Thay.
A comunicação real demanda ao menos um pouco de conhecimento de si mesmo, ou de não fugir de se ver e refletir sobre isso. Sobre essas identidades que afirmamos, nos identificamos. Ou das circunstâncias em nós que fugimos. E caminhar, como diz Thay, ouvindo profundamente e falando com amor.
“Mesmo que ouçamos as notícias várias vezes ao dia, mesmo que comuniquemos uns com os outros várias vezes ao dia, isso não significa que a comunicação real é possível! Ainda não entendemos uns aos outros. Ainda não entendemos o sofrimento e as dificuldades de nós mesmos, do outro”.
— Thich Nhat Hanh
Segue o vídeo na íntegra, traduzido e legendado em português.
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Foto: Plum Village.
Sugestão: https://www.youtube.com/watch?v=Zb3_wqX7yNE
o video aqui..https://www.youtube.com/watch?v=WZeA3pp6HjQ