A publicação de um comentário do estudioso Alan Wallace sobre os ensinamentos de “A Essência Vajra“, do mestre budista Dudjom Lingpa (1835–1904), pelo blog Sobre Budismo, inspirou a reunião desses três trechos de discursos abaixo sobre o Samsara, uma palavra que carrega uma definição desafiadora sobre a compreensão das ilusões humanas na vida. Em comum, os trechos trazem a afirmação de que o “Samsara não é um lugar“, mas uma maneira “deformada” de ver e compreender o mundo. Os outros dois trechos são do livro “A Arte da Vida“, da monja portuguesa da tradição tibetana Tsering Paldrön, e o último do monge zen-budista brasileiro Meihô Genshô, num discurso recente intitulado “O Sutra do Coração da Sabedoria“.
“Samsara não é um lugar, não é o planeta Terra, não é a existência humana, não é nada disso. O Samsara é esse jeito de ser, em que ficamos perambulando por aí, feito cachorro de rua, sem rumo, fundamentalmente deludidos, agindo a partir do desejo e da hostilidade. Sem amadurecer, sem florescer, sem cultivar a verdadeira felicidade, saltando de uma lado para o outro, até a morte finalmente chegar.”
~ Comentário sobre “A Essência Vajra” de Düdjom Lingpa (via Sobre Budismo)
“Nirvana quer dizer “sem fogo”. “Fogo extinto” ou, “sem vento das paixões”. Nirvana é a mesma coisa que Samsara. Samsara é Nirvana. Samsara é o mundo da perambulação, onde andamos de lugar pra lugar, procurando a felicidade ou satisfação. Nós procuramos, andando sem fim, procurando e trocando. Uma casa nova, um carro novo, etc, procurando, procurando, sempre trocando, isso é samsara. É o mundo rodando e você procurando a solução e satisfação de problemas sempre novos. Vão sempre surgir, porque é característica desse mundo mutante. O que faz essas sensações todas, são o “vento das paixões”. E nós somos como folhas tocadas pelo vento das paixões. NIR é uma partícula negativa e VANA é o fogo das paixões. Então podemos traduzir como “Fogo extinto, ou sem ventos”, e, na analogia que estou fazendo, não tem vento para empurrar a folha de lado pra lado. Não tenho paixões mundanas, então de repente surge uma grande calma, porque não importa. Atrasou, atrasou, perdeu o avião, perdeu o avião, tem comida tem, não tem comida, não tem. Perdi tudo que tinha, perdi tudo que tinha. Ganhei bastante, ganhei bastante. As paixões não estão empurrando, então o mesmo lugar que é Samsara, é Nirvana. O que mudou é a maneira de ver. Você tira os seus olhos, que vêm o Samsara, e troca pelos olhos de Buda, olha com uma mente iluminada e aí aquilo que era Samsara, virou Nirvana. Então Samsara não é um lugar. E Nirvana também não. Não dá pra “ir” para o Nirvana. Você muda a si mesmo e aí, este lugar torna-se Nirvana.”
~ Monge Genshô, em “Sutra do Coração da Sabedoria”, pelo Daissen Zendô
“O samsara não é um lugar – por exemplo, o nosso mundo. É uma maneira de ser prisioneiro das próprias percepções. Há quem diga que, se traçarmos no chão um círculo ao redor de um peru, o animal pensará que está preso e se deixará morrer de fome, sem jamais tentar atravessar o círculo. Embora todos os seres possuam dentro de si a luminosidade da consciência sutil, a felicidade inefável de que falam os místicos e aqueles que viveram experiências de quase morte, não a reconhecem. Divorciadas dessa profunda luminosidade, nossas percepções adquirem uma “opacidade” que nos mantém no engano. Embora sejam círculos de giz à nossa volta, pensamos que se tratam de barreiras reais, ficamos prisioneiros delas e os esforços desastrados que fazemos para nos libertarmos geralmente só pioram a situação”. Na tradição budista, a esta percepção deformada do mundo dá-se no nome de “ignorância” e diz-se que é a raiz do samsara.”
~ Tsering Paldrön, em “A Arte Da Vida“
Obs.: A imagem do post é uma parte da thangka da “roda da vida” (Bhavacakra), usada no Budismo Tibetano para ilustrar o samsara. Neste site há uma imagem completa e com explicações.
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A vida que julgamos ser a nossa é uma ilusão, e ilusão não significa que não exista, mas sim que é diferente daquilo que julgamos ser.
Apenas com os “Olhos” da alma poderemos ver a verdade do que somos.
http://paulorenatoconsultor.blogspot.pt/2014/01/aquilo-que-pensas-que-e-nao-o-e.html
Achei fantástica a explicação do Monge Genshô. Simples assim!!! Mas infelizmente muito, muito difícil para olhos que estão se iludindo cada dia mais. Sinto que estamos cada dia mais presos ao Samsara…
Penso que não vale a pena me preocupar com as chamadas grandes questões, a vida vai continuar nos comendo aos bocados.
Nem com as pequenas grades do meu arcabouço. Esse é o maior transtorno, quase tão impossível como se desvencilhar dos demagogos conselhos desses (e dessas) depressivos gurus das redes socias… Meu maior problema ainda é com os pequenos e incontáveis sapos que sou obrigado a engolir todos os dias.
Mas é isso aí, se o dia foi bom então tudo bem. E se não, está tudo bem, também. A Lusitana roda e “O” samsara gira num parafuso sem fim. Até completar a volta. E no mais: mais cerveja.
Somos uma única coisa, não devemos dividir. não faço parte da nirvana, eu sou nirvana.
Samsara é um software, formate-se!
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Linda explicação. Entendo que não existe um lugar específico para estar em paz, nem dentro nem fora. Criamos o Samsara e é como um labirinto onde a porta de saída só é encontrada depois de muito desgaste e desilusão. Nirvana é o resultado da desilusão, onde podemos vislumbrar a liberdade que somos. Depois de Nirvana nada mais importa. Mas só a exaustão causada pelo samsara é capaz de abrir a porta definitiva para a felicidade. Deus Onipotente permite assim, para que a doença “samsara” seja a cura do doente…
Parabéns pelo belo site tem conteúdo bem explicativo vou compartilhar com outras pessoas