Porque tenho que assumir tantas responsabilidades se vou morrer no final? Sri Sri Ravi Shankar responde

srisriravishankar-artedeviver-resposta-responsabilidadesA risada de Sri Sri Ravi Shankar ao receber essa pergunta pode indicar o quanto ela é espirituosa e curiosa. “Bem…“, começa ele, ainda sorridente, “porque você nasceu“, provoca. É só o começo da resposta, que segue completa abaixo, traduzida para o português por este blog da página oficial do mestre da Arte de Viver no Facebook, do vídeo gravado de sua passagem pela Ucrânia em janeiro de 2015 (não há vídeo no YouTube, portanto, para assistir à resposta em vídeo você deve acessar este link, que leva Facebook).

A pergunta quase implica ou sugere uma resposta que trate da possibilidade da existência além da morte, pois a morte aniquilaria o hipotético “bom karma” de ter assumido tantas responsabilidades. Mas Sri Sri não segue por esse caminho, e dá uma resposta prática, fundamentada na necessidade de uma consciência mais ampla, e sugerindo um exercício simples para que seja possível a compreensão. Ele diz que “se você tomar a vida como um fardo, então o trajeto será uma grande e arrastada miséria“. Até aí nenhuma novidade, é uma conclusão óbvia até. E então, neste caso, eu poderia estender a pergunta para: e se for? um fardo? Vamos imaginar que seja outra coisa só para fugirmos da verdade (dela ser um fardo)? Um buscador da verdade teria que estar disposto a entrar nessa floresta escura de verdades incômodas se quiser ir além dos “prazeres” das crenças simplistas.

Pois então, obviamente Sri Sri já entrou e atravessou essa floresta. Ele cita a necessidade de descobrir o conhecimento da vida, que sem ele não há como se conseguir uma resposta verdadeira suficiente para a pergunta. Mas sua sugestão é primeiro descansar e experimentar a ausência de desejos e de insatisfações, que vem através de um profundo descanso, que por sua vez gera contentamento. E “o contentamento (com a vida) só vem através do conhecimento“, sentencia. O conhecimento extinguiria, segundo ele, a visão de que a vida é um fardo. O conhecimento seria capaz de levar o sujeito dessa dimensão da escassez em que surge a pergunta (e a visão da vida como fardo) para a dimensão oposta, a da abundância, onde nada é fardo e há energia e disposição suficientes para qualquer trabalho.

Leia a resposta abaixo e assista ao vídeo neste link.

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19 de janeiro de 2015 – Perguntas e Resposta Sessão 5

Pergunta: Gurudev, porque eu tenho que assumir tantas responsabilidades? Tenho a responsabilidade pela minha felicidade, pela felicidade do meu marido, pela felicidade da minha família, etc. Porque tudo isso se no fim eu tenho que morrer?

SRI SRI RAVI SHANKAR: Bem, porque você nasceu! Quando você nasce você tem que tomar conta de tudo isso. Há duas maneiras de olhar pra vida: 1. Ou você a toma como um fardo e torna sua vida uma longa e arrastada miséria, ou 2. Você a toma com entusiasmo, pensando “Se tenho todas essas responsabilidades e desafios, posso realizá-los”. E você segue em frente com celebração.

Quando você está cansado é que você sente que tudo isso é demais para você dar conta. Quando isso acontece, eu diria, sente-se e relaxe. Imagine que você não tem nenhuma responsabilidade. Encontre o mais profundo descanso dentro de você, e então você terá a força que precisa para ir em frente. Diga apenas uma coisa para você mesmo, “Eu não quero nada!”. Esse querer nada lhe dá o mais profundo dos descansos.

Descansar não é somente deitar fisicamente na cama, é o modo da mente que diz, “Estou satisfeito, estou contente”. Só o contentamento pode lhe dar descanso e esse contentamento não virá até você por fazer ou se empenhar em nenhuma atividade. Ele virá até você somente pelo conhecimento. E o conhecimento é:

  1. Tudo é impermanente.
  2. Eu estou satisfeito.
  3. Não quero nada.

Essa é a essência do conhecimento.

Geralmente quando perguntamos às crianças o que elas querem, elas dizem “nada”. A semente do querer nada está em cada criança. Elas apenas não sabem que tudo é impermanente porque elas não perceberam tudo que há ao redor delas. Mesmo por alguns momentos todo dia, se você disser “Tudo é impermanente, não quero nada” e sentar e descansar profundamente, você voltará com energia e entusiasmo para assumir milhões de empregos no mundo, e poder fazer milhões de pessoas felizes. Então nenhum trabalho parecerá significante ou insignificante.

Essa é a linguagem do Upanishad: não é nem significante nem insignificante. Você sequer pode qualificar coisas pequenas de insignificantes, nem dar muita importância a coisas muito significantes. Em vez disso, você pode se manter fazendo qualquer trabalho, qualquer ação, em qualquer lugar, e em cada uma delas ser benéfico para o mundo”.

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5 Comments

  1. says: Adriana Abreu

    Precisamos ter uma consciência mais ampla para vivermos tranquilos, sem ânsias de termos respostas para tudo. Essa consciência ampla envolve termos noção de que tudo é impermanente, o meu eu (ego, mente) está satisfeito e não deseja nada. Quando estamos neste estado chamado de contentamento, somos mais criativos, mais capazes, mais disponíveis para o trabalho, mais atentos, etc., somos mais tranquilos relativamente às emoções que vão surgindo, etc.. Num primeiro momento, esta revelação é maravilhosa e o sentimento que surge é realmente de contentamento! Contudo, a nossa mente (e eu vejo isso em mim) com o passar dos dias, começa a quer algo mais. Quer conflito. Quer jogo e diz-nos que nós ainda não sabemos o suficiente do que é realmente viver. Gratidão por este espaço.

  2. says: dulce dias

    muito bom.

    Tem sido quase anos de fardos “insuportaveis”…que me chegou a ficar doente grave. Mas também as coisas não podeiam ver até mim senão fosse eu ir atrás delas e outras por obrigação familiar.

    Como desformatar isto.

    Bejinhos.

  3. says: dulce dias

    Aceito tudo que tenho vindo a ler. Mas é dificil pôr em prática, neste “mundo” extremamente competitivo que me leva á sobrevivencia…quase cair na rua a pedir esmola. Chega, mas não sei mais que fazer.

    Para além disso fui educada num ambiene familiar, esse sim um fardo insuportavel e por nem sempre tive autonomia, tive que o “assumir”. Agora é total e absoluta distanciamento familiar, após morte dos meus pais ( no espaço de 1 ano)e ainda por cima relacionamentos de fachada e hipocrisia, que não sei mesmo lidar por mais que me esforce em me adaptar.

    Sou demasiado verdadeira para certas situações.

    Desculpe a franqueza.

    Em boa verdade o mundo laboral mudosu muito e tormou-se mesmo um jogo e ganha o mais fraco e inevitavelmente com conseuqnecias a nivel pessoal.

    Cumprimentos,

    1. Oi Dulce, obrigado por escrever. Você já tentou fazer o que Sri Sri recomenda na fala dele? Pode ser uma experiência interessante, mesmo que pareça algo leve demais, se feito com verdade tem potência.

      Não é simples sair de um dimensão onde experimentamos as circunstâncias como tão difíceis e chegar a essa visão que Sri Sri oferece, mas deixar-se provocar pela proposta pode ser um início. Questionar a própria visão da experiência que se tem também. Será que isso é assim mesmo? Será que aquilo é assim mesmo?

      Aceitar o que você lê aqui é uma generosidade sua, que agradeço. Mas aceitar não significa aprovar, e assim vá em frente e discorde, salutar, necessário, mas use seu apreço pela verdade e pela franqueza consigo mesmo, porque isso é precioso, para absorver o que está dito na fala de Sri Sri. Verdade leva a conhecimento, e verdadeiro “contentamento só vem com conhecimento”.

      Um abraço & namastê,

      Nando

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