Quem é o dono do óleo? E da água? E do ferro? Martin Luther King Jr discursando “Para Onde Vamos A Partir Daqui?”, em 1967

No dia 16 de agosto de 1967, o pastor protestante Martin Luther King Jr (1928-1968), ativista político pelos direitos civis dos negros e do amor ao próximo, defensor do movimento da não-violência e Prêmio Nobel da Paz (1964), fez um grande discurso chamado “Para Onde Vamos A Partir Daqui” (do inglês “Where Do We Go From Here”), que tem alguns trechos selecionados traduzidos por este blog abaixo (e com o ótimo áudio original na sequência). Autor do famoso discurso “I Have A Dream” (Eu Tenho Um Sonho), de 1963, Luther King consegue no discurso abaixo unir assuntos como a reflexão da submissão do povo aos domínios do petróleo e outros recursos naturais ao enaltecimento do amor entre todos os seres humanos — e “não estou falando de uma tolice emocional”, discursou ele, “mas de um amor forte e determinado“.

Era outra época, há mais de 45 anos, onde Comunismo e Capitalismo ocupavam a pauta política, quando os Estados Unidos viviam as críticas à Guerra do Vietnã, que ainda levaria 8 anos para acabar, e tempos em que Luther King planejava uma espécie de “Occupy Washington DC” com seu movimento “Poor People’s Campaign”. Menos de um ano depois desse discurso, Martin Luther King Jr foi assassinado em um hotel em Memphis, Tennessee (EUA).

Seguem alguns trechos do discurso:

Existem 40 milhões de pobres aqui (nos Estados Unidos). Um dia teremos que nos perguntar “Porque temos 40 milhões de pobres nos Estados Unidos”? E quando vocês começar a se perguntar isso, começarão a levantar questionamentos sobre o sistema econômico, sobre uma maior distribuição da riqueza. Quando vocês perguntam isso, vocês começam a questionar a economia capitalista. E estou simplesmente dizendo que, cada vez mais, temos que começar a fazer perguntas sobre toda a sociedade. Somos chamados a ajudar os mendigos derrotados pela vida do mercado. Mas um dia devemos chegar a ver que um edifício que produz mendigos precisa se reestruturar. Isso significa que as perguntas devem ser levantadas. Vejam, meus amigos, quando você lida com isso, você começa a se perguntar “Quem é dono do óleo?”. Você começa a se pergunta “Quem é dono do minério de ferro?”. Você começa a se perguntar “Porque as pessoas tem que pagar contas de água num mundo que é dois terços água?”. Essas são questões que devem ser levantadas.

 

Agora, não pensem vocês que eu me encurralei aqui. Não estou falando de Comunismo. Estou falando essa manhã que o Comunismo esquece que a vida é individual. E o Capitalismo esquece que a vida é social, e que o Reino da Fraternidade não está na tese do Comunismo nem na antítese do Capitalismo, mas em uma síntese maior. Está numa síntese mais ampla que combina as verdades de ambos. (…)

 

E eu digo a vocês, também decidir permanecer com o amor. Porque eu sei que o amor é verdadeiramente a resposta definitiva para os problemas da humanidade. E vou falar dele em todo lugar que eu for. Sei que não é popular falar dele em alguns círculos hoje. Não estou falando de uma tolice emocional quando falo de amor, estou falando de um amor forte e determinado. Tenho visto muito ódio (…) e digo a mim mesmo que o ódio é um bardo muito grande para se carregar. Decidi pelo amor. Se você está procurando o maior bem, acho que você pode encontrá-lo através do amor. E o que é bonito é que estamos indo contra o errado quando amamos, porque João estava certo, Deus é amor. Aquele que odeia não conhece Deus, mas aquele que ama tem a chave que desbloqueia a porta para o significado da verdadeira realidade.

 

~ Martin Luther King Jr. (1929-1968), no discurso “Where Do We Go From Here”, Atlanta (EUA), em 16 de agosto de 1967.

O áudio original de Martin Luther King Jr do trecho final do discurso, que contém as partes traduzidas acima, está no vídeo abaixo, original em inglês, de 16min:

O discurso na íntegra, em inglês, pode ser lido num subsite da Universidade de Stanford (EUA) aqui.

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2 Comments

  1. says: norma7

    É muito bonito esse discurso. Foi uma excelente: “Porque hoje é sexta”.
    Pincei uns trechinhos:

    Quote
    ‘E com um espírito de esforço em direção a verdadeira autoestima, o Negro deve corajosamente jogar fora as algemas da abnegação e dizer para si mesmo e para o mundo: “Eu sou alguém. (Oh yeah) Eu sou uma pessoa. Eu sou um homem com dignidade e honra. (Vá em frente) Eu tenho uma história rica e nobre, por mais doloroso e explorados que a história tem sido.
    (…)”Eu sou negro (sim senhor), mas eu sou negro e bonito.” (Sim) Esta [aplausos], esta autoafirmação é a necessidade do homem negro, forçado (Tudo bem) por crimes do homem branco contra ele. (Sim)
    (…)

    E a outra coisa é que eu estou preocupado com um mundo melhor. Estou preocupado com a justiça, eu estou preocupado com a fraternidade, eu estou preocupado com a verdade. (É isso mesmo) E quando se está preocupado com isso, nunca se pode defender a violência. Por meio da violência você pode matar um assassino, mas não pode matar o assassinato. (Sim) Através da violência você pode matar um mentiroso, mas não pode estabelecer a verdade. (É isso mesmo) através da violência você pode matar um inimigo, mas você não pode matar ódio através da violência. (Tudo bem, isso é certo) A escuridão não pode colocar para fora a escuridão, apenas a luz pode fazer isso. [Aplausos]
    (…)
    “Superamos! (Sim) Superamos! Do fundo do meu coração, eu acreditei (Sim) que iria superar. ” [Aplausos]’
    Unquote

    QUANTO A:
    “Porque as pessoas tem que pagar contas de água num mundo que é dois terços água?”

    NÃO É BEM ASSIM. Algum tempo a história mudou (para quem se interessar):

    http://www.geologo.com.br/aguahisteria.asp

    Qual o volume de água potável disponível?

    Os dados que são utilizados pela mídia mundial são: De toda a água disponível na terra 97,6% está concentrada nos oceanos (tabela 1.1). A água fresca corresponde aos 2,4% restantes. Você acha 2,4% pouco? Então ouça isso: destes 2,4% somente 0,31% não estão concentrados nos polos na forma de gelo. Resumindo: de toda a água na superfície da terra menos de 0,02% está disponível em rios e lagos na forma de água fresca pronta para consumo.
    Grata e Boa Sorte, Norma

  2. says: Nilda Maria

    O final do discurso me lembrou do filme Matrix, mais precisamente, do guardião das chaves:

    “…Aquele que odeia não conhece a Deus, mas aquele que ama tem a chave que desbloqueia a porta para o significado da verdadeira realidade.”

    A verdadeira realidade, eu diria, é sair dessa Matrix desconcertante. Todo mártir histórico parece repetir a ordem “acorde, Neo”.

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