“Essa é minha Mente, Luminosa e Vazia”: entendendo o Vazio segundo o Budismo Vajrayana, por Tsoknyi Rinpoche

“O vazio é uma palavra que à primeira vista pode parecer um pouco assustadora“, diz o monge Tsoknyi Rinpoche, reconhecido mestre nepalês das tradições Drukpa Kagyü e Nyingma e detentor da linhagem Ratna Lingpa e Tsoknyi, neste artigo para a revista americana Shambala, “Esta é Minha Mente, Luminosa e Vazia” (This Is My Mind, Luminous and Empty). “Se olharmos mais fundo, no entanto, podemos ver que o vazio que experimentamos em nossas vidas é na verdade um prospecto positivo“, continua ele, num dos trechos do artigo que foi traduzido para o português e segue abaixo. Líder da Fundação Pundarika, Tsoknyi Rinpoche é autor de vários livros, entre eles “Fearless Simplicity: The Dzogchen Way of Living Freely in a Complex World”, e acabou de lançar o novo “Open Heart, Open Mind — Awakening the Power of Essence Love” (2012).

O vazio, ou vacuidade, é uma dos quatro noções budistas fundamentais, junto da impermanência, a ausência de ego e o sofrimento, e não raras vezes é confundida ou interpretada superficialmente. A visão de Tsoknyi Rinpoche é trazida para cá para ajudar a esclarecer essa noção, que, segundo o próprio Dalai Lama, é uma das mais difíceis de se comprender e realizar.

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“Esta é Minha Mente, Luminosa e Vazia” (TRECHO)
Por Tsoknyi Rinpoche

Tradicionalmente, uma das palavras que descreve a base de quem e do que somos – na verdade, a base de todos os fenômenos – tem sido traduzida como “vazio” (emptiness); uma palavra que, à primeira vista, pode parecer uma pouco assustadora, uma sugestão, apoiada pelos primeiros tradutores e intérpretes da filosofia Budista, de que há algum tipo de vácuo no centro do nosso ser.

A maioria de nós, em algum ponto em nossas vidas, experimentou algum tipo de vazio. Nós nos perguntamos “O que estou fazendo aqui?”. Aqui pode ser um trabalho, um relacionamento, uma casa, um corpo com as juntas rangendo, uma mente com memórias desaparecendo.

Se olharmos mais fundo, no entanto, podemos ver que o vazio que experimentamos em nossas vidas é na verdade um prospecto positivo.

Vazio é uma tradução grosseira para o termo Sânscrito “shunyata” e o termo Tibetano “tongpa-nyi”. O significado básico da palavra em Sânscrito “shunya” é “zero”, enquanto que a palavra Tibetana “tongpa” significa “vazio” – mas não no sentido de um vácuo ou um nada, mas sim em um sentido de que a base da experiência está além de nossa capacidade de perceber com nossos sentidos e ou de capturá-la em um conceito bonito e conciso. Talvez um entendimento melhor do sentido profundo da palavra possa ser “inconcebível” ou “inomeável”.

Por isso quando Budistas falam sobre o vazio como a base do nosso ser, não queremos dizer que quem ou o que somos é nada, um zero, um ponto de vista que pode dar margem a um tipo de cinismo. O ensinamento verdadeiro sobre o vazio implica e um espaço infinitamente aberto que permite que qualquer coisa possa aparecer, mudar, desaparecer, ou reaparecer. O significado básico de vazio, em outras palavras, é abertura, ou potencial. O nível básico do nosso ser, somos “vazios” de características definíveis. Não somos definidos por nosso passado, nosso presente ou nossos pensamentos e sentimentos sobre o futuro. Temos um potencial para experimentar qualquer coisa. E qualquer coisa pode ser pensamentos, sentimentos ou sensações físicas”.

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6 Comments

  1. says: norma7

    Gostei muito mais do conceito acima postado sobre o VAZIO, como “abertura ou potencial” (acesso ao Campo de Infinitas Possibilidades – é isso?), do que a versão na qual a mente é vista como uma bagagem a ser abandonada, um espaço a ser esvaziado, porque “mesmo vazio, se você está presente, então está cheio”.
    Se você sente que está vazio, não o está absolutamente. Você está aí. Apenas o nome mudou. Agora você se chama vazio. Dá para ser como é difícil, né?.

    Estou em dúvida se se chama O Navegador ou O Navegante (The Journeyer do Gary Jennings – reconhecido por suas minunciosas pesquisas) onde há uma passagem (que me impressionou vivamente e de forma negativa, tanto que não aesqueci), onde Marco Polo chega a um Mosteiro e conhece um monge num processo (?) de eliminação de ego e esvaziamento da mente. Essa anulação consistia na amputação dos membros superiores e inferiores. M.Polo conhece o venerado monge em seu cesto suspenso por cordas e se admira de ver aquele ser composto apenas de tronco e cabeça em tal serenidade…
    É muito bom ver que tudo na VIDA está em constante evolução, aprimoramento, inclusive as religiões.

    Fiquem Bem.

    1. PS. Me parece que o monge desse filme ou não entendeu direito o negócio da eliminação do ego (que não é “criado” pelos membros nem neles se sustenta) ou o cineasta quis assustar e afastar os telespectadores ocidentais dessa “filosofia”… (rs). É realmente uma imagem pra se ficar impressionado.

      PS2: Essa é uma das interpretações possíveis do Vazio, mais hindu, colorida e “manifestacionista” – algo que o Ocidente gosta muito porque se relaciona melhor com a realização de desejos e com algo que lembra a liberdade do carma. ;)

      Namastê.

  2. says: norma

    Não, vc não entendeu. É um livro.
    Esse autor (passou 12 anos no México) só para escrever sobre os Astecas, para vc ter uma ideia. Suas pesquisas são aprofundadas. Daí a “sensação” de desconfortom sabe quando vc começa a seguir que aquilo não é fição? O livro é imenso. Dá pena do Marco Polo. Eu o li e reli porque é muito primoroso e depois o doei para uma Bibl. Pública (minha herdeira natural – rs).
    ++++
    De qq forma gostei dessa visão do Vazio.
    ++++
    Nando, você (aki no Dharmalog) é competentemente ‘amável’ e isso é um elogio na minha escala de valores espirituais. Mais uma vez grata e Boa Sorte!
    Norma

    1. Agora entendi, obrigado Norma.

      Também pelo elogio, que tb me parece bom na minha escala de valores. ;) Você tem enriquecido muito os assuntos aqui e tem sido sempre muito cuidadosa e prodigiosa, é bom receber uma palavra do bem de que é do bem.

      Um abraço grande.
      Namastê!

  3. says: Rigdzin

    CANÇÃO VAJRA

    A la la ho!

    Vajradara, senhor, que permeia todas as famílias,
    Guru pai gracioso, Suplico-lhe.
    Dentro do céu não-surgido da mente,
    As aparições inumeráveis, não importa como surgem,
    Quando não aceito ou rejeito, confirmo ou nego, se dissolvem no espaço.
    A mente não-surgida deste iogue é completamente à vontade!
    Vou cantar uma canção sobre a felicidade vazia desta facilidade.
    Ouça aqui todos vocês, homens e mulheres felizes!
    Uma vez que é difícil para as pessoas desta época obscura prestar atenção,
    Ouça aqui vocês homens e mulheres dignos!
    Mesmo só para ver ou encontrar-me,
    Um iogue com quem cada ligação é significativa,
    É um encontro com alguém que é muito raro de se encontrar.
    Todos os seus atos mundanos miríade
    E todas os seus possíveis pensamentos iludidos
    Deixe-os estar em estado não-dual além dos conceitos.
    Livre da noção de vidente e visto,
    Enquanto você manter a essência de sua mente,
    Praticante e meditante dissolvido no espaço,
    E não há nem mesmo as palavras “meditação além de conceitos.”
    Esta felicidade vazia que é incessante
    É a bondade do guru pai glorioso.
    Eu sou um iogue que aceita de bom grado
    A carne, vinho e mudra.
    Como o pavão índio banqueteando-se com veneno,
    Todas as emoções, não importa o que,
    São meus grandes adornos, as cinco sabedorias.
    Se você quiser compartilhar a experiência do seu pai, siga-me!
    Não importa qual a emoção que experimentar,
    Eu sou um iogue não viciado, que traz os cinco venenos para o
    caminho.
    Todos vocês benfeitores, homens ou mulheres, altos ou baixos,
    Cada ligação que você faz comigo vai ser significativa,
    E, com certeza, você vai ganhar o renascimento na ilha gloriosa de
    Chamara.
    Para ser livre de dúvida tem benefício inconcebível.
    Eu sou um iogue que gosta de tudo o que surge.
    Este é o domínio do veículo vajra.
    Tendo atravessado fronteiras conceituais menores do veículo,
    Eu sou um iogue que se deleita no maior veículo.
    Ao cantar essa música livre de construções mentais,
    Que suas mentes desfrutem do veículo vajra
    E que leve para a ilha gloriosa de Chamara.

    No lugar sagrado conhecido como Serkyam, como meus discípulos dignos Drodon Tsogyal e Dondrub Drolma desde a coincidência auspiciosa com preciosos presentes, este foi proferido por Ngawang Tsoknyi (Drubwang Tsoknyi, o primeiro), tendo como caminho o vajra veículo do mantra secreto, desfrutando a espontaneidade de tudo que surge. Que seja virtuoso. Que seja virtuoso. Que seja virtuoso. +?

  4. says: Humberto

    Você saberia definir o espaço? É claro que não, porque o espaço não existe. Você só poderia definir o espaço baseado nas formas alí existentes. O espaço é destituido de formas. Agora, subjetivamente você poderia definir o vazio? É claro que não, porque o vazio não existe. Você só poderia definir o vazio, baseado nos conteúdos dos pensamentos, sentimentos e emoções. O vazio é destituído de formas e ou conteúdos. Deus, a Consciência do Ser, é tudo isso. Procure ser sereno como um lago profundo e seja testemunha silenciosa das ondas temporárias em sua superfície, isso é meditação é a Consciência do Ser.

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