“O problema é você, a solução é você”, por Swami Dayananda

dayananda3Trecho da entrevista de Swami Dayananda Saraswati, um dos maiores mestres do Vedanta na Índia, ao projeto Intuition, para Jeffrey Mishlove, sobre o tema da auto-aceitação. A frase-título do post é uma das respostas contidas na entrevista mas também é o título de um livro de Swami Dayananda, “The Problem Is You, The Solution Is You“.

MISHLOVE: Prazer estar com você. Você sugeriu que todas as nossas atividades humanas são motivadas por uma falta de auto-aceitação — uma busca por plenitude, uma luta para ser algo que nós pensamos que não somos.

DAYANANDA: Sim, é verdade. É evidente na busca de todos, sejam indianos ou americanos, homens ou mulheres, jovens ou velhos. Você vê que sempre há um esforço da parte de todos para serem diferentes do que somos, do que é. E essa tentativa de ser diferente surge de uma auto-não-aceitação: não está tudo bem comigo, então tenho que ser diferente. E pra ser diferente, tentamos manipular as situações de acordo com nossos próprios gostos e desgostos, para que nós possamos nos aceitar. Portanto, todo o tempo buscamos auto-aceitação. Este problema é o problema fundamental; eu vejo como o problema fundamental. Por isso a solução está em si mesmo, e não pode estar em outro lugar. Porque se eu sou o problema, porque eu não sou aceitável pra mim mesmo é o problema, então eu sou o problema. Se eu sou o problema, então ninguém mais será a solução. Eu sou a solução. Então, se eu sou o problema, eu deveria ver que eu sou aceitável para eu mesmo. Se nós pudermos ir além nisso, qualquer pensamento positivo não irá me ajudar, porque pensamento positivo às vezes é bom, mas valida o pensamento negativo. O que eu não tenho é tão verdadeiro quanto o que eu tenho. Então se eu olhar para eu mesmo com referência ao que não tenho, ao que quero ter, então fico deprimido. Por isso, qualquer mudança na minha parte não vai me mudar fundamentalmente, porque se eu sou um ser limitado na minha visão, e qualquer mudança que eu faça, qualquer embelezamento pessoal ou mudanças externas que eu realize, eu ainda me verei como um ser limitado. É simples – como uma soma finita mais uma soma finita é sempre uma soma finita.

MISHLOVE: Em outras palavras, quando definem objetivos, digamos, “Se ao menos eu tivesse um novo paletó, tudo estaria bem. Se ao menos eu tivesse reformado a casa, as coisas estariam perfeitas”.

DAYANANDA: Sim, verdade. E uma vez remodelada a casa, alguma outra coisa aparece. Então o problema não é exatamente o que me falta. A falta é o problema. O problema é o meu querer. O que eu quero difere de pessoa pra pessoa, então minha própria educação, minhas próprias necessidades, e meus próprios gostos e desgostos determinam exatamente o que eu quero. O problema é que eu quero, e este problema não vai ser resolvido preenchendo esses quereres. E por isso, se eu sou uma pessoa finita, uma pessoa limitada, que quer, não importa que mudança eu traga pra minha vida, vou continuar querendo todo o tempo. Então o processo de “se tornar” não vai me ajudar. É o que eu disse — uma soma mais uma soma finita é sempre uma soma finita.

MISHLOVE: Parece mais que um problema. Parece o que eu chamaria de um dilema; somos presos ao tempo, de uma maneira. Você usou a palavra “se tornar”. Estamos sempre “nos tornando”. Parece que existencialmente não há saída.

DAYANANDA: Não há saída, então ou nós aceitamos nosso desamparo, e aceitamos nossa parte e vamos buscar, ou olhamos para nós mesmos de maneira diferente. Talvez só exista uma solução possível. Se através de uma mudança eu não vou parecer diferente na minha própria visão, na minha própria luz, em minha auto-estima, talvez eu esteja olhando pra mim de maneira errada. talvez eu não queira nada. Olho pra mim erradamente, e então tento resolver um problema que não existe. Por isso o Vedanta é isso — quer que você olhe pra você mesmo, re-examine você mesmo. Então você presume o problema, e logo depois começa a resolvê-lo. Essa própria pressuposição é questionada: Estou eu querendo? Então você questiona a noção mais fundamental sobre você mesmo — estou eu querendo?

MISHLOVE: Está realmente faltando algo a mim, ou é parte da ilusão?

DAYANANDA: Sim. Ilusão ou noção errada, para usar uma expressão mais simples. Pode ser apenas um erro. Posso estar olhando pra mim mesmo erradamente, posso ter me tomado por dado (“taken for granted”, uma expressão não fácil de traduzir, mas que considera uma coisa como existindo permanentemente na rotina, sem muita análise ou reconhecimento dada a ela). Porque nós descobrimos durante os anos, em nossas vidas, todos aprendemos a questionar qualquer coisa que venhamos a saber, seja por percepção ou inferência, porque nós queimamos nossos dedos ao tirar conclusões, e ao descobrir que nossas conclusões estavam erradas, e então nos tornamos muito muito precavidos, tomamos tudo com um grão de sal. E sempre há a probabilidade; o conceito da probabilidade governa nossas buscas por conhecimento, o que é muito saudável. Mas quando é sobre nós mesmos, todos nos tomamos por dados, porque achamos que a única coisa que é auto-evidente, e tudo o mais é evidente pra mim.

(…)

A entrevista completa (em inglês) está neste link.

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5 Comments

  1. É impossível exprimir com palavras a sensação de alegria e agradecimento de ter sido entregue em minhas mãos este texto. Ele veio de encontro a muitas perguntas que imaginava não haver repostas. Obrigada !

  2. says: nandop

    Agradeçamos a Swami Dayananda, Neide. Acho que você vai gostar do livro também, ele é bem curto e ainda mais rico que esse trecho. Obrigado pelo comentário!

  3. says: Nirvan

    Este trecho lembrou-me da pergunta fundamental do advaita vedanta, quem ou o que sou eu? Ou ainda, buscando o eu perguntador, questionador, indo, através da auto-inquirição, atrás do “eu” que faz a pergunta ou emite o desejo… é como caçar a si mesmo no espaço escuro do interior de si mesmo.

    Referências: Ramana, Mooji.

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